sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Casamento e amor genuíno

Hoje de manhã tive um sonho em que eu discursava (literalmente) para algumas pessoas, inclusive um padre, sobre o casamento. Vou tentar lembrar de tudo... Mas já me adianto: sou contra a concepção de casamento (tanto o religioso quanto o civil).

O casamento religioso é uma hipocrisia. Você casa quando (pensa que) ama e passa por todo um procedimento ritualístico para dizer: não sou mais solteiro(a); estou fora do mercado; está vendo esta aliança aqui? É um elo que, ao mesmo tempo em que me une a esta outra pessoa, exclui-me sexualmente de todo o resto...

Acho que podemos concordar que uma traição de namoro não é tão ruim do que uma traição de pessoas que se encontram em matrimônio, porque, afinal, você casou, você tem, agora, um papel que lhe dá direitos sobre as ações (e, talvez, bens) de seu cônjuge. Você registrou, perante um representante de Deus, suas palavras e um desejo; agora você deve cumprí-lo. Não julgarei os traidores e nem os traídos: acho que o diálogo entre o casal é essencial - de preferência antes da traição, para que não haja mágoa, pois somos muito apegados ainda.

Ora, quando ocorre o matrimônio não há aquelas frases: "até que a morte os separe"; "o que Deus uniu, o homem não pode separar"? Mas... e o divórcio? Nem sempre é "até que a morte os separe" e o homem separa, sim!

No sonho, eu perguntei ao padre: Padre, casamento evita divórcio?

Serei sincera: não lembro o que ele respondeu. Só lembro que, em sua resposta, ele citava algo muito insignificante e fora do assunto, e todos que estavam lá reunidos começaram a discurtir essa outra coisa, uma coisa ínfima. Mais uma razão para o sonho ter sido tão bom: mostrou como as pessoas reagem, geralmente, em suas vidas, dando importância para coisas triviais sem nem pensar sobre o que as formam como indivíduos, como uma cultura. Eu sou fruto de uma união, que, na "visão de Deus", não deu certo. Grande parte de nossa sociedade é fruto de casamento(s), e são poucos os que param para pensar no que significa este ritual - e se ele realmente tem alguma importância.

Infelizmente, não lembro da resposta do padre. Eu suporia um belo "não", afinal, para divorciar-se, dois têm que estar casados. Mas ele pode ter citado alguns valores de sua igreja ou algo como "o que Deus uniu, o homem não separa", coisas que podem muito bem serem desconstruídas uma vez que focalizamos os valores religiosos dentro de uma sociedade que não necessariamente comporta tais valores.

Bom, em várias igrejas, o padre é um representante de Deus, certo? E o juiz seria um representante do Estado, dos homens portanto. O casamento civil - existente porque o Estado é laico - é também um registro perante outras pessoas: mais um papel indicando união que lhe dá direitos, em juiz, sobre o cônjuge. Eu diria que é praticamente a mesma coisa, mas este sai mais barato!

Ainda bem que inventaram a tal da união estável: uma possibilidade menos ritualística. Não há prazo mínimo que determine a união estável e não precisa nem morar junto, "desde que existam elementos que o provem, como por exemplo, a existência de filhos". Mas e se eu quiser continuar sendo considerado como solteiro(a)? E se eu quiser casar em casa, meu cônjuge e eu? E se eu quiser um relacionamento aberto ou a três, a quatro, a cinco?

O direito do Estado de atribuir a você uma característica com base em suas ações eu até entendo, pois é o direito do humano em geral, nós é que formamos o Estado. Mas, da mesma forma que eu contribuo com a formação do Estado, não poderia eu selar, com meu cônjuge, uma união, um casamento se eu assim desejar?

Nossa cultura superestima o matrimônio. E pior: quer que ele seja só entre um homem e uma mulher, como se tivesse direitos sobre a vida alheia. É por isso que sou contra a união matrimonial: ela não representa nada além do amor pelo apego, do amor ciumento, do amor doentio. Não representa nada além de um papel no qual diz: "Amamo-nos! E agora penso que tenho mais direito de posse por você!"

No sonho, após fazer muito barulho para chamar a atenção dos ouvintes para mim depois de eles terem se distraído imensamente com aquela coisa insignificante que o padre falou, lembro-me de que, para refutar a resposta do padre, eu falava de um amor divino: que, para tal amor, a traição seria irrelevante. Porque, nele, não há apego, há apenas e simplesmente o desejo de felicidade do outro. Se o outro está feliz, daí eu também estarei feliz. Não é preciso nenhum ritual para o amor genuíno. Precisamos, sim, é de prática.


Vide esta fala de Jetsunma Tenzin Palmo sobre amor romântico e amor genuíno. A legenda pode ser ativada no canto inferior direito do vídeo.


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